Mas se tu me cativas, minha vida será como que cheia de sol...


domingo, 25 de novembro de 2012

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Pode a morte ser sono, se a vida não é mais que sonho,
E se as cenas de êxtase passam qual espectros?
Os prazeres transitórios semelham visões,
Mas pensamentos a morte como a grande dor.






















Como é estranho o vagar do homem na terra

Em sua vida maldita não pode desvencilhar
O rude caminho; nem ousa sozinho entrever
Seu augúrio futuro que não é senão despertar.

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Poema: John Keats; A morte.

Arte: Alyssa Monks; Lula.

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sábado, 29 de setembro de 2012

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Não há amor perdido, nem se fingem milagres
Não reparto o destino que me expia em saudades...
E o grito ecoa profundo;
"Quero o meu mundo!"
O assalto recomeça, o espelho fascina
Sigo encoberto, o quebrando domina...
Mas a vida desalinha!
Sepulto a ruína, ressurjo em apreço,
E de novo, recomeço.


















Só quem se arrisca a ir longe demais
descobre o quão longe se pode ir.

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Poema: T.S.Elliot. Recomeçar.
Arte: Salvador Dalí. O nascimento de um novo homem, 1943.

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domingo, 2 de setembro de 2012

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Era o relógio de meu avô
e quando o ganhei de meu pai ele disse
Estou lhe dando o mausoléu
de toda esperança e todo desejo.



















Dou-lhe este relógio não para
que você se lembre do tempo,
mas para que você possa esquecê-lo
por um momento de vez em quando
e não gaste todo o seu fôlego
tentando conquistá-lo.

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Excerto: William Faulkner, O som e a fúria.
Arte: Edward Kienholz. O Restaurante, 1965.

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domingo, 12 de agosto de 2012

Primeiro, você tem nosso perfil?
Você usa olho de vidro, dentes postiços ou muleta, 
atadura ou gancho,
Peitos ou sexo de borracha,

Suturas mostrando faltar alguma coisa?
Não, não? Então
Como podemos lhe dar alguma coisa?
Pare de chorar.
Abra a sua mão.
Vazia? Vazia. Tome essa mão

A fim de enchê-la e disposta

A servir xícaras de chá e espantar enxaquecas
E fazer o que você mandar.
Casa com isso?
Tem garantia.

De que fechará seus olhinhos no final

E se dissolverá de aflição.
Fazemos novo estoque de sal.
Vejo que você está nu em pêlo.
Que tal este terno -

Preto e formal, até que não cai mal.

Casa com isso?
É à prova d'água, de estilhaço, à prova
De fogo e bombas no telhado.
Acredite, vão enterrá-lo com isso.


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Agora a sua cabeça, desculpe, é bem vazia.
Tenho o remédio para isso.
Vem cá, benzinho, saia já do armário.
Bem, o que você acha disso?
Branca como papel pode ser escrito

Mas em vinte e cinco anos será prata,

Em cinquenta, ouro.
Uma boneca de carne, onde quer que você olhe.
Sabe costurar, sabe cozinhar,
Sabe falar, falar, falar.

Funciona direito, não tem nenhum defeito.

Você tem um buraco, é uma compressa.
Você tem um olho, é uma imagem.
Meu garoto, é sua última chance.
Casa com isso, casa, casa com isso.

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Poema: Sylvia Plath, O candidato.

Arte: René Magritte, Homenagem à Mack Sennett, 1934.

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quinta-feira, 19 de julho de 2012

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A sós
para mim
e para ti também,
quer dizer: eu e tu,
quer dizer: nós.

Nós assim, 
sem ninguém...
Quando eu e tu
nos encontramos,
eu só, tu só,
de repente passamos
a ser nós,
e como sozinhos já não ficamos, 
ficamos a sós...


Eu e tu
a sós,
seja lá onde for, 
quer dizer: nós
e nosso amor...

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Poema: J.G. de Araujo Jorge. Definição, 1958.
Arte: Marc Chagall. A história de Qamar Zaman e da arte da esposa do joalheiro, 1948.

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quinta-feira, 21 de junho de 2012

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A solidão era eterna
E o silêncio inacabável.


Detive-me com uma árvore
e ouvi falar as árvores.


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Arte: Gustav Klimt. Floresta de Faias, 1903.
Poema: Juan Ramón Jiménez, A solidão era eterna.


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domingo, 27 de maio de 2012

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E ele, evadindo-se tão prodigiosamente da sua velha carne encarquilhada, tornava-se cada vez mais feliz, cada vez mais inacessível. Cada vez mais imorredouro.


Ao morrer levava, sem dar conta disso, as mãos cheias de estrelas...

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Texto: Saint Exupéry. Cidadela.
Arte: Henri Matisse. O voo de Ícaro.

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quarta-feira, 9 de maio de 2012

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Deus ao mar o perigo e o abismo deu,


Mas nele é que espelhou o céu.

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Arte: René Magritte, o futuro das estátuas.
Verso: Fernando Pessoa, mar Português.

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terça-feira, 24 de abril de 2012

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Quando
com minhas mãos de labareda
te acendo e em rosa
embaixo
te espetalas

quando
com minha acessa antorcha e cego
penetro a noite de tua flor que exala
urina
e mel
que busco eu com toda essa assassina
fúria de macho?
















que busco eu
em fogo
aqui embaixo?
senão colher com a repentina
mão do delírio
uma outra flor: a do sorriso
que no alto o teu rosto ilumina?

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Poema: Ferreira Gullar, um sorriso.
Arte: Tâmara de Lempicka, Adão e Eva.

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quarta-feira, 4 de abril de 2012

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A terra leva-nos por terra;


mas tu, mar,
levas-nos pelo céu.

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Poema: Juan Ramón Jiménez.
Arte: René Magritte.

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quinta-feira, 22 de março de 2012

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Desdobrei a minha orfandade
sobre a mesa, como um mapa.
Desenhei o meu itinerário
até ao meu lugar ao vento.
Os que chegam não me encontram.
Os que espero não existem.



E bebi licores furiosos
para transmutar os rostos
num anjo, em copos vazios.

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Poema: Alejandra Pizarnik, Festa.
Arte: Edward Hopper. Lado leste interior, 1922.

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domingo, 4 de março de 2012

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Porque te tenho e não
porque te penso
porque a noite está de olhos abertos
porque a noite passa e digo amor
porque vieste a recolher a tua imagem
porque és melhor que todas as tuas imagens
porque és linda desde o pé até a alma
porque és boa desde a alma a mim
porque te escondes doce no orgulho
pequena e doce
coração couraça
porque és minha
porque te olho e morro
se não te olho amor
se não te olho


porque tu sempre existes onde quer que seja
porém existes melhor onde te quero
porque tua boca é sangue
e tens frio
tenho que te amar amor
tenho que te amar
ainda que esta ferida doa como dois
ainda que busque e não te encontre
e ainda que
a noite pese e eu te tenha
e não

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Arte: Marc Chagall. O sonho de Paris, 1969.
Texto: Mário Benedetti. Coração couraça.

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quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

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Gota
a gota
tomba o silêncio.
Condensa-se no telhado da mente
e cai por tanques de água abaixo.
Para sempre sozinho...
sozinho...
sozinho.



ouço o silêncio tombar e espalhar seus
círculos até os mais longínquos recantos.
Saciado e repleto, sólido na satisfação da meia-noite,
eu
a quem a solidão destrói
deixo que o silêncio tombe
gota a
gota.

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Excerto: Virgínia Woolf. As ondas, 1931.
Arte: Frank Benson. Dia de chuva, 1906.

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sábado, 21 de janeiro de 2012

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As minhas mãos mantêm as estrelas,
Seguro a minha alma para que se não quebre
A melodia que vai de flor em flor,



Arranco o mar do mar e ponho-o em mim
E o bater do meu coração sustenta o ritmo das coisas.

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Arte: Marc Chagall, Mãos.
Poema: Sophia de Mello Breyner Andresen.

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